Um professor Waldorf judeu na Alemanha
Este texto foi publicado em uma revista voltada para Escolas Waldorf. Se interesse para mim está na postura franca do professor Samuel Ichmann, judeu alemão e professor Waldorf há mais de 30 anos, diante das acusações de antissemitismo nos meios antroposóficos e na própria educação Waldorf. Se, como visto anteriormente, em Israel a educação judaica me parece garantida em uma escola Waldorf, pelo meio judaico no qual está inserida, fora de Israel - em particular na Alemanha - as fronteiras entre as visões religiosas ficam muito porosas e, junto com elas, visões antissemitas clássicas vêm à tona. Este foi um texto que me deixou bastante incomodado.
Aqui a situação é outra: não se trata de uma escola Waldorf judaica, mas de um escola comum, permeada por um ambiente cristão, onde leciona um professor judeu que tenta, de algum modo, transmitir algum valor judaico - seus valores universais - a seus alunos; mas se depara com um antissemitismo clássico, para mim claro.
Não vejo o antissemitismo aqui como algo inerente à antroposofia nem à pedagogia Waldorf, mas ao ambiente que a permeia, como permeia provavelmente outros ambientes por lá.
Tampouco entendo que se deva generalizar este antissemitismo em toda a Alemanha dos dias atuais, um dos maiores defensores e parceiros de Israel, depois da barbárie nazista, onde a comunidade judaica cresce e se desenvolve a olhos vistos. Mas em oba parte este artigo me assusta, por expor claramente que as bases para o antissemitismo estão vivas, e muito vivas.
Uri Lam.
O Que Deus É – ou o que também não - 1a Parte
A visão de um professor Waldorf judeu
Samuel Ichmann
Educação Viva – Revista para Escolas Steiner Waldorf
N.2 Primavera de 2007
Tradução: Uri Lam, fev. 2011
Samuel Ichmann reflete sobre a vida como um professor judeu que trabalha em uma escola Waldorf alemão, e sugere alguns pontos onde os caminhos do Judaísmo e da Antroposofia podem se cruzar
Costumamos escutar a acusação de “antissemitismo nas escolas Waldorf”, mas como é a experiência de um professor Waldorf com raízes judaicas? Depois de décadas de experiência, ele conclui que apenas citar princípios antroposóficos está longe de ser suficiente, se quisermos evitar as armadilhas da discriminação. Embora não haja tais atitudes antissemitas, os clichês sobre o Judaísmo - seja como produto do cristianismo tradicional, seja a partir de uma interpretação dogmática de Steiner - também aparecem nas escolas Waldorf.
Falar sobre ser judeu na Alemanha abre um campo minado! Estabelecem-se imediatamente desvios e armadilhas: de sentimentalismo nostálgico, do diálogo suprimido, do buraco negro da nossa resposta à crueldade praticada contra os judeus alemães, da resignação sentida em relação à destruição que a Shoá causou às esperanças de que a cultura alemã e judaica poderiam se unir novamente. Acima de tudo, há o constrangimento enorme que este tema desperta.
Mas além de todas as armadilhas e dificuldades, este ainda é um assunto à espera de uma resposta, com tudo o que ainda há para se apresentar.
Como um judeu que vive na Alemanha, na verdade, eu também percebo que aqui - e talvez só aqui - chegamos a esse ponto zero, como uma tabula rasa, de que um novo começo pode ser realmente possível. O choque do inimaginável, talvez, tenha criado um espaço onde podemos, e de fato devemos, abordar esse assunto de uma maneira completamente nova e diferente. Os estigmas de um desastre no corpo da história da Alemanha significa que cada desvio desse caminho leva diretamente ao escândalo. Seria possível o que foi relatado a partir de Hungria contemporânea acontecer aqui e agora, onde, em uma partida de futebol no estádio de Budapeste envolvendo um clube que os judeus sempre apoiaram, desde que se possa lembrar, que hooligans do outro lado começaram a gritar: “Morra, escória judaica”? Ou será que algo assim só não acontece na Alemanha porque de fato não há um time de futebol apoiado pelos judeus, e porque a maioria dos alemães nunca viu um “judeu vivo de fato”?